Num café.

Encostei o nariz, regelado ao vidro húmido. Vi-te do outro lado da vidraça. Rias-te. Estavas feliz. Naquela mesa a beber o teu chocolate quente. Haviam passado anos desde a última vez.
Era Inverno. Nevava. Deixei-me ficar assim, não querendo ser visto ao mesmo tempo.
Perdi-me uns segundos naquela tua imagem dos teus belos cabelos, da tua bela silhueta, da tua terna alegria.
A última vez que te vi, foi quando sai do nosso apartamento, estilo antigo remodelado, com cores claras e acolhedor. Disseste que era o fim. Que não querias partilhar mais vida comigo. Era o meu castelo feito de areia a desabar. Chorei sozinho enquanto fazia as minhas malas. Levei uma foto nossa. De resto, apenas a minha roupa, não adiantava me agarrar ao passado. Deixei-te largada no sofá da sala, com uma camisola minha, uma caneca de chá quente, com os cabelos desaranjados. Estavas linda na mesma.
A chave na mesa da entrada. Fechei a porta atrás de mim.
Não sei mais o que se passou dentro daquelas paredes. Sei apenas que continuas a viver lá.
Eu vagueei, mudei de país. Tornei-me o solteirão que desde sempre o meu destino me quis fazer. Percorri ruas e ruas, numa esperança de encontrar a musa.
Voltei mais velho, mais gasto, mais desleixado. Já não cortava a barba totalmente. Os cabelos grisalhos queriam me mostrar que não era o mesmo que lutava, que corria riscos.
Cansei-me.
Encontrei-me assim a passear na minha terra natal. Quando ia entrar no cafezinho da rua que mais gosto. O quente acolhedor.
Estava lá ela dentro. Foi aí que permaneci à porta a observá-la. Ela não me viu. Tinha mais pessoas junto dela, um homem do seu lado que parecia ser próximo. E mais um casal. Eram me todos familiares.
Entrei. Diriji-me ao balcão. Não falei com niguém, já não era mais uma pessoa espirituosa. Decidi então sentar-me. Uma mesa de intervalo. Fingi que não reconhecia ninguém.
Comi o meu salgado. Bebi um galão. Li o jornal. Fiz tudo calmamente. Já não ouvia a sua voz há muito tempo. Observava o quanto podia.
'Sr. Ricardo, mais alguma coisa?' Foi ai que olharam para mim.
'Ricardo és tu?'
'Sou.'
'Estás tão diferente!'
'São os anos...'
Ela nem uma palavra pronunciou. A mão que tinha junto da dele, afastou-a e apenas me observava.
Estagnamos no tempo, perdidos um do outro.
Encontramo-nos no nosso um só espirito.
Elevei-a aos mais altos céus num segundo.



[to be continued]

Comentários

Enviar um comentário