Pedaço de vida

Quando eu tinha os meus dois meses de idade fui retirado de uma forma inexplicável de onde deveria pertencer. Com a inocência mais que apurada de nada me apercebi, chorei por dois dias e como sempre a minha mãe (esta sim a minha verdadeira), disse, calei-me para sempre. Portanto, era uma criança pacifica, sem grandes distúrbios da minha constante calma e bem-estar. Estava de bem com a vida portanto. Até ao dia que me apercebi que tinha mais alguém que perturbava a estabilidade.
Apanhei o medo, fixei o trauma. Ainda hoje entrar naqueles espaços, maioritariamente brancos, com gente de branco, com armas mortíferas me deixa em pânico. Porque que uma inocente criança e feliz até então teve que ser destabilizada? É o medo, é o pavor, é o pânico, é a dor que corrói os sentimentos. Passei assim a odiar todas as pessoas que me puseram em tal situação. Pequeno demais para gerir ódio por quem fosse, mas já o tinha.
A partir dai escondi-me. Senti os arrepios na espinha da fuga, calei a voz pelo medo do oponente. Perdi em mim o que de bom tinha, sofri, sem nunca ninguém me perguntar o que pensava enquanto estava em silencio, ou quando apenas sorria por mais nada conseguir dizer. Ainda hoje é assim escondo-me atrás do sorriso, porque afinal sempre fui assim.
Tornei-me tão sensível quanto a sensibilidade pode ser frágil, criei o meu mundo fantástico e horroroso ao mesmo tempo, porque ali era livre, mas só me encontrava lá eu e a minhas imaginações de "como eu gostava que..." Nunca ninguém me compreendeu, nunca ninguém me amou sem parar. Param e rápido.
Passaram-se anos, tornei-me adulto. Percorri as mais variadas sensações e sentimentos numa tão curta vida. Decidi-te.
Porquê que me abandonaram? Sempre fui deixado desde a nascença, até tu que eu amei tanto. Culpa minha por te perder, por não controlar o medo e todo o frio que sentia na minha mente por estar a ficar vazia de novo, não queria mais mundo fantástico em mim. Arrependimento dorido.

Ruptura. Algum dia chegaria a ela. Deixei todo o passado e mostrei que poderia ser considerado com mais valor do que tinha.
Mudei a atitude, quebrei o meu ser, renovei a minha vida. Perdoei.
Fui mais do que algum dia me acharam ser. E só por isso cheguei aos meus dezoito anos com mais poder do que me foi dado a nascença.

E quem eu odiava passou a ser o meu dia-a-dia e assim tornei-me poderoso.



Apenas usei o que me foi concedido.


Aceitem.

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